Fernanda Ebling
O estado do Mato Grosso do Sul vai além da fauna e flora exuberante. Este Estado carrega consigo um leque variado de artistas que levam, para onde vão, características da região e um querer se “reiventar”. Além dos artistas plásticos, cênicos, escritores, artesãos, entre outros, somos abençoados com músicos que permeiam por diversos gêneros musicais. Alguns procuram manter a regionalidade na música que produz, outros misturam o que há de fronteriço com outros gêneros e há aqueles que vão além.
Há algum tempo venho acompanhando o desenrolar da música feita no Estado, mais precisamente trabalhos que carregam consigo a fronteira, o pantanal, e todas as outras belezas que nossa região abraça. Posso citar Almir Sater, Geraldo Roca, Paulinho Simões, a Família Espíndola, Filho dos Livres (Guga Borba e Guilherme Cruz), Giani Torres e muitos outros artistas que bradam no som e na voz sons que nos identificam como um estado fronteiriço.
Dentre esses nomes há um que faz esse “ir além” e traz para a contemporaneidade toda a beleza de poder se reinventar em uma Era de “cola e copia”. Este é Guilherme Rondon.
Pantaneiro de coração, os álbuns do artista são repletos de músicas no compasso ternário. Não só isso, ele consegue reproduzir sensações cotidianas em letras cheias de poesia e sentimento. As músicas do intérprete e compositor, mesmo com elementos que caracterizam a nossa música regional, rompem as fronteiras físicas e subjetivas de um lugar só. É muito mais que local, tem presente a contemporaneidade e o “se permitir” ir além.
E dentro dessa ousadia que Guilherme nos apresenta, o mais novo trabalho musical do artista, “Melhor que seja raro”, teve seu lançamento realizado no final de dezembro, em Campo Grande. Composto por 13 músicas, o álbum, além dos compassos ternários, traz a contemporaneidade existente nos outros quatro discos solos anteriores, marca registrada do cantor. Além disso, mostra uma variedade de ritmos e estilos, com um samba lento, com folk, guarânia e até timbres de guitarras pra uma balada rock’n roll, e muito mais.
Este trabalho apresenta, em sua totalidade, um se descobrir menino, descobrir amado pela vida, um aventureiro disposto a se perder nas terras e nos mares que podem surgir no percurso da vida.
Das treze faixas que compõe o trabalho, oito são em parceria com Alexandre Lemos: “Brincadeira na Beira”, “Enxurrada”, “Pão pra dividir”, “Entre o rio e o mar”, “Depois a gente se fala”, “Mentira não”, “Ruas de São Paulo” e “Rasta Feliz”. Brincadeira na Beira abre o álbum e já de início dá a sensação de descoberta e renascimento que irá acompanhar o álbum todo. Em um dueto com Leo Minax, a música traz na letra que a vida “sempre é amiga” mesmo que tenhamos vontades de alternar entre “açúcar e sal” para alcançar a liberdade. Assim, nesse tom e caminho, as outras 7 músicas compostas em parceria com Alexandre unem letra e melodia num mergulho profundo. E,como de costume, a junção desses dois artistas nos apresenta letras que são verdadeiras descrições da vida; das idas, das voltas, das redescobertas de si mesmo, da recorrente vontade de ser livre.Além dessas oito, contamos com músicas advindas de parcerias com Zélia Duncan (Melhor que seja rara), Iso Fisher (De que reino sou rei), Zé Edu (Vento veio contar), Luiz Carlos Sá (Alma e Razão) e Murilo Antunes (Amor perfeito é só uma flor).
Ao ouvir “De que reino sou rei” e escutar Guilherme narrar, através de sua voz calma e serena, seu olhar sob uma criança que antes fora ele mesmo e se perguntar sobre seu futuro, o qual não se sabe, não se prevê, pode-se dizer que este trabalho, mesmo com tantos estilos e parcerias variadas, tem a redescoberta como tema. Descobrir-se vivo, descobrir-se capaz, redescobrir-se forte. É entender que o final de algo não precisa ser o fim de tudo, “que por mais que a lua se esconda, ela vai nascer” outra vez. Que os dias vêm para aprendermos com os erros, pois “é preciso enfrentar o que é verdade”. A VIDA É FEITA PRA VIVER
E num aconchego e carinho, este álbum tem não só parceria nas letras e melodias que encantam, como também é rodeado de pessoas talentosas em sua construção. “Melhor que seja raro” tem as vozes e instrumentos de Leo Minax, Celito e Gilson Espíndola, Américo & Nando, Jaques Morelenbaum, Marcos Borges, Hamilton Griecco, José Namen, Marcelus Anderson e Wlajones Carvalho. Uma banda formada por Alex Mesquita (Baixo), Sandro Moreno (Bateria e Percussão) e Webster Santos (Violões, Guitarra, Bandolim). E juntando todos esses talentos, gostos, sabores e inspirações, Rondon e Alex Cavalheri conseguiram produzir este trabalho extremamente sensorial.
CELLIA FERNANDA PIETRAMALE EBLING é graduada em Letras Português/Inglês pela UEMS e mestra em Linguística e Transculturalidade pela UFGD. Sua paixão pelas letras e pela música vem do seu tempo de criança. Pianista, cantora, compositora e co-fundadora do Arrebol Coletivo, publicou “Rabiscos que sufocam: palavras perdidas entre fumaça, whisky, sexo e solidão” (2013).